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quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Cobrança de taxa pela Anotação de Responsabilidade Técnica pelo CREA é inconstitucional

 

D.E.

Publicado em 17/12/2009
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2007.70.00.013915-1/PR
 
 
RELATORA
:
Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
APELANTE
:
CONSELHO REGIONAL DE ENG/ ARQUITETURA E AGRONOMIA DO ESTADO DO PARANA - CREA/PR
ADVOGADO
:
Osmar Alfredo Kohler e outro
:
Simone Kohler
APELADO
:
BELA VISTA INCORPORACOES LTDA/ e outro
ADVOGADO
:
Alexandre Medeiros Regnier
REMETENTE
:
JUÍZO FEDERAL DA 08A VF DE CURITIBA



EMENTA

TRIBUTÁRIO. ANOTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE TÉCNICA. PREÇO. TAXA. ART. 2º, § 2º, DA LEI Nº 6.496/77. INCONSTITUCIONALIDADE.
1. O preço público constitui-se de receita originária decorrente da contraprestação por um bem, utilidade ou serviço numa relação de cunho negocial em que está presente a voluntariedade, não sendo esse o caso da anotação de responsabilidade técnica - ART, cuja natureza reveste-se das qualidades de taxa. 2. A Corte Especial deste Tribunal declarou a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77, por violação ao artigo 150 da Constituição Federal. (Argüição de Inconstitucionalidade na APELRE nº 2007.70.00.013915-1/RS). 3. Hipótese em que foi determinado à autoridade impetrada que registrasse as Anotações de Responsabilidade Técnica - ART's de competência das impetrantes sem a cobrança da respectiva taxa. 4. Apelo desprovido.


 
ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 01 de dezembro de 2009.

 
Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Relatora
 
 
 
RELATÓRIO
 
Bela Vista Incorporações Ltda. e Betina Lepretti Medeiros impetraram o presente mandado de segurança contra ato praticado pelo presidente do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Paraná - CREA/PR, consistente na exigência de taxa para o registro, expedição e apresentação de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART).

A autoridade impetrada prestou as devidas informações.

Ao proferir a sentença, a magistrada a quo concedeu a segurança, para o fim de declarar a inconstitucionalidade do art. 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77 e, por conseguinte, determinar à autoridade impetrada que registre as Anotações de Responsabilidade Técnica - ART's de competência das impetrantes sem a cobrança da respectiva taxa.

Em suas razões de apelação, sustentou o Conselho, em síntese: a) que o valor da ART não corresponde a tributo, mas sim a preço, de modo que não há ofensa ao artigo 150, I, da CF; b) a constitucionalidade do artigo 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77.

Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

Esta Turma suscitou, perante o colendo Órgão Especial, incidente de inconstitucionalidade do artigo 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77, por violação ao artigo 150 da Constituição Federal.

A Corte Especial no julgamento da Argüição de Inconstitucionalidade na APELRE nº 2007.70.00.013915-1/RS, de minha relatoria, declarou a inconstitucionalidade do art. 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77, por afronta ao art. 150, I, da Constituição Federal, nos termos do acórdão a seguir transcrito:

TRIBUTÁRIO. INCIDENTE DE ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART 2º, § 2º, DA LEI Nº 6.496/77. ACOLHIMENTO.
1. Considerando que a Constituição Federal exige como requisito de validade e exigibilidade do tributo a sua previsão em lei, a qual deve conter, expressamente, todos os elementos necessários à sua caracterização, não é cabível que um ou mais desses elementos sejam instituídos por norma de natureza infra-legal, mesmo que haja lei autorizando.
2. Incidente de argüição de inconstitucionalidade do artigo 2º, § 2º, da lei Nº 6.496/77 acolhido.

Retornaram os autos para prosseguimento do julgamento da apelação. É o relatório.


 
VOTO
 
O Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Paraná - CREA/PR em suas razões de apelação sustentou que o valor da ART não corresponde a tributo, mas sim a preço público, assim, concluiu que não há ofensa ao artigo 150, I, da CF. Nessa temática o Conselho referiu que A ART não é taxa propriamente dita, eis que, embora compulsória a sua cobrança na medida da fiscalização de interesse da coletividade inerente ao poder de polícia do Conselho Profissional, também servirá para a formação do acervo individual do particular (caráter privado), como garantia de responsabilidade nos trabalhos do profissional, resultando para este, ainda, em um benefício pecuniário. Ao final, caso fosse considerado por esta Corte que o valor da ART fosse considerado tributo, pugnou pela constitucionalidade do artigo 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77, sendo, em qualquer hipótese, invertidos os ônus sucumbenciais.

A ilustre magistrada "a quo" refutou, na decisão ora atacada, os argumentos do Conselho apelado referente a questão da taxa referente a ART ser preço público, nas seguintes letras:

(...)
Nem se diga que aludida exação não se trata de taxa, mas sim de preço público, o qual não se submeteria aos requisitos exigidos pelo sistema jurídico tributário.
O E. STF, conforme súmula n. 545, assim se posicionou sobre a diferença entre taxa e preço público:

"Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu"

O jurista LEANDRO PAULSEN assim abordou o assunto:

"Deve-se ter bem presente a diferença entre taxa e preço público. Aquela é tributo, sendo cobrada compulsoriamente por força da prestação de serviço público de utilização compulsória ou do qual, de qualquer maneira, o indivíduo não possa abrir mão. O preço público, por sua vez, não é tributo, constituindo, sim, receita originária decorrente da contraprestação por um bem, utilidade ou serviço numa relação de cunho negocial em que está presente a voluntariedade (não há obrigatoriedade do consumo). A obrigação de prestar, pois, em se tratando de taxa, decorre direta e exclusivamente da lei, enquanto, em se tratando de preço público, decorre da vontade do contratante. Por ter suporte no poder de tributar do Estado, submetendo os contribuintes de forma cogente, a exigência de taxas está sujeita às limitações constitucionais ao poder de tributar (art. 150 da CF: legalidade, isonomia, irretroatividade, anterioridade, vedação do confisco). A fixação do preço público, de outro lado, independe de lei; não sendo tributo, não está sujeito às limitações do poder de tributar" (in PAULSEN, Leandro. Direito Tributário - Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 48).

Portanto, dentre os elementos diferenciadores de taxa e preço público, e cuja análise importa para o deslinde deste feito, encontra-se o da compulsoriedade. Com efeito, aquela é contraprestação de serviços públicos de utilização compulsória, sendo impedido ao cidadão utilizar-se de outro serviço para atingir a mesma finalidade. O preço público, por sua vez, corresponde à contraprestação por serviço público prestado com caráter facultativo, ou seja, ao usuário é possível valer-se de outro serviço ou modo para atingir a finalidade almejada. Utiliza o serviço público, destarte, mediante emissão de livre vontade, e não compulsoriamente.
A Anotação de Responsabilidade Técnica - ART junto ao respectivo Conselho Regional é obrigatória, cuja não observância implica na aplicação de multa. Não há como o profissional interessado utilizar-se de outro meio para suprir a exigência.
Trata-se, portanto, de exigência compulsória, uma vez que deve ser observada obrigatoriamente pelo profissional que deseja executar obras ou prestar serviços de Engenharia, Arquitetura ou Agronomia. Como a submissão dos contribuintes ocorre de forma cogente, o valor cobrado para esse fim possui natureza de taxa e, portanto, submete-se às limitações constitucionais do poder de tributar.
O fato de que, indiretamente, as ARTs possam trazer um benefício pecuniário aos respectivos profissionais, por meio do aumento de seu acervo técnico, em nada altera a conclusão acima, uma vez que esse fato não é determinante para descaracterizar a natureza jurídica de taxa de referida exação.
Com efeito, tal circunstância não é suficiente para caracterizar o valor cobrado como preço público, uma vez que este pressupõe o caráter volitivo de o contribuinte se utilizar de serviço estatal, quando o fim por ele almejado poderia ser satisfeito de outra forma. No caso das ARTs, consoante exposto, não há outra forma de o contribuinte satisfazer seu desiderato, tendo que a ela se submeter compulsoriamente. Não merecem guarida, portanto, os argumentos que visam retirar o caráter tributário do valor cobrado para sua efetivação.
(...)

Além do que, conforme consta no relatório, a Corte Especial deste Tribunal, por unanimidade, declarou a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77, por violação ao artigo 150 da Constituição Federal, acórdão cujo inteiro teor consta nos autos às fls. 172/177.

Dessa forma, afastada incidência desse dispositivo, não merece guarida a pretensão esgrimida pelo CREA/PR neste recurso que devolveu a matéria referente a discussão de que a taxa, em tela, é preço, e ainda, quanto a constitucionalidade do artigo 2º, § 2º, da Lei nº 6.496/77, devendo ser mantida a sentença que determinou à autoridade impetrada que registrasse as Anotações de Responsabilidade Técnica - ART's de competência das impetrantes sem a cobrança da respectiva taxa.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.

 
Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Relatora

sábado, 24 de setembro de 2011

CONCURSO VESTIBULAR. CANDIDATO QUE CURSOU O ENSINO FUNDAMENTAL EM REDE PRIVADA COM BOLSA DE ENSINO INTEGRAL OFERECIDA POR ENTIDADE FILANTRÓPICA. ENSINO MÉDIO CURSADO NA REDE PÚBLICA. VAGA PARA COTISTA. POSSIBILIDADE.

D.E.
Publicado em 21/08/2009
 
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2009.04.00.029383-3/RS
 
 
RELATOR
:
Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ
AGRAVANTE
:
FILIPE DA SILVA SILVEIRA
ADVOGADO
:
Caetano Cuervo Lo Pumo e outros
AGRAVADO
:
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL - UFRGS
ADVOGADO
:
Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região


 
DECISÃO

 
Vistos, etc.

1. Acolho o pedido de reconsideração de fls.241/242 e revogo a decisão de fls.238.

2. A matéria dos autos foi decidida pelo Tribunal quando do julgamento do Agravo de Instrumento n.º 2008.04.00.010476-0/RS, consoante voto do relator, verbis:

"O agravo de instrumento foi instruído com cópia do Edital de 17 de agosto de 2007, do Concurso Vestibular de 2008, constando no item 1.5.3 o seguinte:

Para fins deste Edital, entende-se por egresso do ensino público o candidato que cursou com aprovação, no Sistema de Ensino Público, pelo menos a metade do Ensino Fundamental e a totalidade do Ensino Médio.

O agravante cursou a totalidade do ensino fundamental em rede privada de ensino, o que, a primeira vista, seria impeditivo para sua opção pelo sistema de reserva de quotas. No entanto, tal fato se deu em razão de ter sido beneficiado com bolsa de ensino integral fornecida pela Escola Adventista de Osório, caraterizada como entidade filantrópica, conforme se extrai da declaração de fl. 62.

Dessa forma, levando em consideração esse fato, aliado à constatação de que o ensino médio foi cursado na rede pública, tendo logrado obter aprovação no certame, fere à razoabilidade impedir o impetrante de usufruir das vagas para quotistas.

Ademais, conforme comprovado nos autos, não se pode desconsiderar o fato de o impetrante ser pessoa carente, não possuindo condições de estudar em outra universidade que não a pública. Esse aspecto atinente à necessidade demonstrada pelo recorrente e o fato de o sistema de quotas visar à redução das desigualdades sociais estão a legitimar a autorização de sua matrícula.

Por fim, não menos importante salientar que o agravante atingiu a 34ª colocação para 30 vagas. Conforme informa, seis vestibulandos foram convocados em segunda chamada e outro em terceira chamada. Desse modo, se concorresse ao acesso universal, teria direito a vaga, pois a chamada alcançaria a 37ª posição.

Assim, a manutenção da decisão agravada causar-lhe-ia injustificado prejuízo.

Há relevância na fundamentação do agravo de instrumento a autorizar a concessão de provimento antecipativo.

Pelo exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, para determinar à agravada seja efetuada a matrícula do agravante no curso de Engenharia de Controle e Automação."

3. Por esses motivos, com base no art.37, §1º, II, do Regimento Interno da Corte, dou provimento ao agravo de instrumento.

Intime-se.

Comunique-se.

Dil. Legais.

Porto Alegre, 17 de agosto de 2009.

MANDADO DE SEGURANÇA. CRÉDITO FISCAL DECORRENTE DE IRRF. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO SÓCIO. EMPRESA EXECUTADA. PATRIMÔNIO SUFICIENTE PARA SATISFAÇÃO DO DÉBITO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS SÓCIOS.

 


D.E.
Publicado em 08/10/2009
APELAÇÃO CÍVEL Nº 2008.71.10.002534-4/RS
 
RELATORA
:
Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
APELANTE
:
ERICO DA SILVA RIBEIRO e outros
ADVOGADO
:
Fabio Maier Alexandretti
APELADO
:
UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO
:
Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional


EMENTA

 
MANDADO DE SEGURANÇA. CRÉDITO FISCAL DECORRENTE DE IRRF. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO SÓCIO. EMPRESA EXECUTADA. PATRIMÔNIO SUFICIENTE PARA SATISFAÇÃO DO DÉBITO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS SÓCIOS.
1. Tendo em vista a empresa ostentar natureza jurídica distinta dos sócios, não se justifica a responsabilização dos mesmos por débitos fiscais, o que só seria admissível na hipótese de ausência de patrimônio da sociedade para satisfação do débito, que não é o caso dos autos.
2. Logo, os embargantes são parte ilegítima, tendo em vista a responsabilidade subsidiária em relação à empresa executada.
3. Acolhido o apelo para conceder a segurança, a fim de que os nomes dos impetrantes sejam retirados de qualquer cadastro de inadimplência.

 
ACÓRDÃO
 
 
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer do agravo retido e dar provimento à apelação para conceder a segurança, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
 
Porto Alegre, 22 de setembro de 2009.



 
Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Relatora
 
RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença que denegou a segurança.

A parte impetrante postula a reforma da sentença, sob os seguintes argumentos: a) o CTN só admite o redirecionamento nas hipóteses de dolo, fraude ou simulação, a teor do disposto no art. 135, sendo que no caso em tela não houve comprovação acerca de eventual ação penal contra os impetrantes, não podendo o simples adimplemento de tributos ser considerado indício suficiente a ensejar o redirecionamento da execução fiscal; b) somente o Frigorífico Extremo Sul integra o polo passivo da execução fiscal, não tendo sido citados os sócios como responsáveis pelo débito fiscal, sendo correto afirmar que o débito encontra-se fulminado pela prescrição; c) não importa se o débito é referente ao Imposto de Renda Retido na Fonte, mas sim que haja comprovação de infração à lei praticada pelos sócios-gerentes. Requer, por fim, a concessão da segurança, a fim de que os nomes dos impetrantes sejam retirados do sistema CIDA e CADIN. Prequestiona o art.135 do CTN, e arts. 5º, XXXIX, LIII e LVII da CF/88.

O Ministério Público Federal opina pela denegação da segurança.

Processado o apelo, vieram os autos a esta Corte.

É o relatório.


 
VOTO

 
Inicialmente, não conheço do agravo retido interposto, uma vez que não reiterada sua apreciação pela parte agravante.

Os impetrantes pretendem a concessão da segurança, a fim de que os seu nomes sejam retirados do sistema CIDA e CADIN.

Conforme se depreende dos autos, foram considerados devedores solidários de crédito fiscal decorrente de Imposto de Renda Retido na Fonte cobrado da empresa Frigorífico Extremo Sul, tendo sido remetidas DARF's aos mesmos, exigindo o pagamento do referido crédito, no valor total de R$ 255.655,44, até a data de 30/6/2008, sob pena de ajuizamento de ação fiscal (fls. 20/26).

O fundamento legal para a cobrança foi consubstanciado no art. 8º, do Decreto Lei nº 1.736/79, conforme se infere da cópia do despacho nº 00.46.100-08, proferido no Processo Administrativo nº 11040.500430/2005-90 (fl. 27).

Vieram aos autos, também, cópias do executivo fiscal nº 2005.71.10.001636-6, das quais se depreende que o crédito tributário está sendo cobrado judicialmente da empresa Frigorifico Extremo Sul S/A, tão-somente.

Delineado o panorama fático da causa, passo ao exame do meritum causae.

Da (i)legitimidade passiva dos sócios

A atribuição de responsabilidade tributária aos gerentes ou administradores de empresas está ligada à doutrina de desconsideração da personalidade jurídica, originária do direito norte-americano. Essa doutrina surgiu a partir da constatação de que a ficção de separação patrimonial entre empresa e sócios por vezes era utilizada para o cometimento de abusos e fraudes contra os credores. No plano do direito comercial, há regras que contemplam essa doutrina no ordenamento brasileiro. Nesse sentido, podem ser apontados o art. 10 do Decreto nº 3.708/19, o art. 1.080 do Código Civil e o art. 158, caput, da Lei nº 6.404/76.

No campo do direito tributário, a responsabilização dos diretores, sócios-gerentes ou representantes pelas dívidas tributárias de empresas está disciplinada pelo art. 135, inc. III, do CTN da seguinte forma:

'Art. 135 - São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:
(...)
III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado."

Tendo em conta a literalidade do art. 135, inc. III, do CTN, desde logo se verifica que a responsabilidade tributária pode ser atribuída àqueles que, como primeiro requisito, possuem a condição jurídica e/ou fática de gestores da empresa. Excluem-se de plano os que são simplesmente sócios da pessoa jurídica de direito privado, pois o que interessa é a condução dos negócios da empresa.

Da mesma forma, outra anotação a ser feita é que não se pode pretender responsabilizar o diretor, gerente ou representante por atos ou omissões relacionadas a período anterior ou posterior à sua gestão.

Na seqüência de análise, também da literalidade do dispositivo em foco (art. 135, inc. III, do CTN), deve ser ressaltado que a atribuição de responsabilidade aos gestores tem como causa a prática de atos "com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos".

Durante longo período, em tempo não muito distante, especialmente no âmbito jurisprudencial, prevaleceu o entendimento de que o simples inadimplemento da obrigação tributária configurava a infração à lei a que se refere o art. 135, inc. III, do CTN para fins de caracterização da responsabilidade tributária pessoal do gestor, desde que comprovado que exercia tais poderes na empresa no respectivo período. Assim, geralmente, a satisfação da obrigação tributária, no caso de inadimplemento pela pessoa jurídica, era buscada de seu gestor, configurando, na prática, espécie de responsabilidade objetiva.

Atualmente, esse entendimento encontra-se superado, não bastando o mero inadimplemento por parte da empresa para viabilizar a responsabilização pessoal de administradores, gerentes ou representantes, pois esse fato de não cumprir com a obrigação tributária, por si só, não pode ser qualificado como a "infração à lei" prevista no art. 135, inc. III, do CTN.

As sociedades com limitação de responsabilidade limitada a responsabilidade tributária dos gestores é regida pelas disposições do art. 135, inc. III, do CTN, que condiciona a responsabilização tributária dos gestores de empresas à demonstração de fatos de que tenham agido com excesso de poderes, infração à lei ou ao contrato social, assim entendido não apenas o inadimplemento da obrigação tributária.

Desse modo, a princípio, justificam a responsabilização dos gestores (1) a prática de fato caracterizado como ilícito penal, (2) a ocorrência de hipótese prevista em texto expresso de lei - aqui incluído o caso de inadimplemento de tributos por parte de microempresas e empresas de pequeno porte extintas - e, como caso mais comum, (3) a dissolução irregular da empresa.

Inicialmente, observo que a execução fiscal anteriormente referida somente foi ajuizada contra a empresa Frigorífico Extremo Sul S/A. Ademais, consoante se vê da Consulta ao Portal da Justiça Federal, já ocorreu penhora na execução fiscal, tendo sido opostos embargos à execução em outubro de 2008.

Resta comprovado, portanto, que a empresa está em atividade e teve seus bens penhorados para garantia da dívida executada.

Em face de tais circunstâncias, tenho que merece censura o procedimento adotado pela União, no sentido de exigir o cumprimento da obrigação tributária dos impetrantes, tendo em vista que a pessoa jurídica tem natureza distinta de seus sócios. De fato, os bens dos sócios de uma empresa comercial não respondem, em caráter solidário, por dívidas fiscais assumidas pela sociedade.

Sinale-se ainda que, na hipótese vertente sequer houve o redirecionamento na ação de execução fiscal, o que só se justificaria se constatada a impossibilidade de cobrança da pessoa jurídica. Deveras, os autores poderiam ser responsabilizados, em tese, em caso de ausência de patrimônio para satisfação do débito, que não é o caso dos autos.

Portanto, realmente os sócios impetrantes são parte ilegítima, tendo em vista a responsabilidade subsidiária dos mesmos em relação à empresa executada.

Assim, tendo em vista as ponderações supra reputo ilegal a cobrança exigida com base no processo administrativo nº 11040.500430/2005-90, devendo a autoridade impetrada abster-se de inscrever ou, caso já tenha inscrito, retirar os nomes dos impetrantes de qualquer cadastro de inadimplência.

Sem honorários, conforme Súmulas 512 do STF e 105 do STJ.

Condeno a União a reembolsar as custas despendidas pelos impetrantes.

Prequestionamento

Saliento, por fim, que o enfrentamento das questões apontadas em grau de recurso, bem como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias superiores os dispositivos que as embasam. Deixo de aplicar os dispositivos legais tidos como aptos a obter pronunciamento jurisdicional diverso do que até aqui foi declinado. Dessa forma, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão-somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (artigo 538 do CPC).

Dispositivo

Ante o exposto, voto por não conhecer do agravo retido e dar provimento à apelação para conceder a segurança.

 
Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
Relatora

 

EXECUÇÃO FISCAL. CONCURSO DE CREDORES. CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS. FGTS. TRABALHISTAS. PREFERÊNCIA DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS.

D.E.
Publicado em 07/10/2009
 
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2008.04.00.043329-8/SC
 
RELATORA
:
Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE
AGRAVANTE
:
JOSE RICARDO DA LUZ
ADVOGADO
:
Raymundo Marcomim e outro
AGRAVADO
:
UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
PROCURADOR
:
Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
AGRAVADO
:
CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF
ADVOGADO
:
Amauri Farias Ramos e outros
AGRAVADO
:
MUNICIPIO DE FLORIANOPOLIS/SC
ADVOGADO
:
Hilario Felix Fagundes Filho
INTERESSADO
:
EMPRESA EDITORA O ESTADO LTDA/
ADVOGADO
:
Jaime Linhares Neto

 
EMENTA

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. CONCURSO DE CREDORES. PREFERÊNCIA DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS.
No concurso de credores na execução fiscal, os créditos trabalhistas preferem aos da Fazenda Pública, independentemente da ordem das penhoras.

 
ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
 
Porto Alegre, 23 de setembro de 2009.

 
Des. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère
Relatora

 

RELATÓRIO


JOSÉ RICARDO DA LUZ interpõe agravo de instrumento contra decisão, proferida nos autos dos Embargos à Execução Fiscal nº 97.00.002243-9 (Vara de Execuções Fiscais de Florianópolis/SC), que, ao julgar o concurso de credores, colocou como nos primeiros lugares na ordem de pagamento os créditos tributários e do FGTS, em detrimento dos trabalhistas.

Sustenta que o art. 186 do CTN estabelece a prevalência dos créditos trabalhistas em relação aos tributários, e que o art. 711 do CPC sobrepõe a preferência do direito material à de direito processual, independentemente da natureza jurídica que originou a execução fiscal, se contra devedor solvente ou insolvente. Pede a reforma da decisão agravada, para que restabelecida a preferência do seu crédito trabalhista.

Com contrarrazões.

É o relatório.


 
VOTO
 
Em sua bem fundamentada decisão ora combatida, o MM. Juízo a quo, em suma, considera que, segundo os ditames do art. 612 do CPC, também em execução fiscal é a ordem das penhoras que garante ao exeqüente a preferência sobre os bens penhorados.
Sua conclusão tem o seguinte teor:

"Assim, e utilizando os critérios do art. 186, do CTN, que estabelece a preferência do crédito trabalhista e de acidentes do trabalho sobre o tributário, e do art. 2.º, da Lei nº 8.844/94, que dá ao crédito de FGTS o mesmo privilégio do trabalhista, e considerando ainda o art. 711, CPC, que prescreve que, entre créditos com a mesma preferência, será atendido em primeiro lugar a quem primeiro penhorou.
Considerando também o art. 29, § único, da Lei n.º 6.830/80, que prescreve que, entre créditos com a mesma preferência, serão atendidos, nesta ordem, os da União e suas autarquias, os dos Estados e de suas autarquias pro rata e dos municípios e de suas autarquias pro rata." (grifou-se)

No entanto, rogada vênia, é clara a redação do art. 186 do CTN em estatuir a supremacia dos créditos trabalhistas:

"O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho. (Redação dada pela LC nº 118, de 2005)."

Logo, havendo concurso entre créditos trabalhistas e tributários, os primeiros têm preferência, independentemente da ordem das penhoras.

Neste sentido firmou-se a jurisprudência, como atestam os seguintes julgados por suas respectivas ementas:

"TRIBUTÁRIO E PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. ART. 186, DO CTN. PREFERÊNCIA DO CRÉDITO TRABALHISTA AO TRIBUTÁRIO. CONCURSO DE CREDORES. DEVEDOR SOLVENTE OU INSOLVENTE. CRITÉRIO ALHEIO À PREVISÃO LEGAL. CRÉDITO TRABALHISTA. NECESSIDADE DE PLURALIDADE DE PENHORAS OU MEDIDAS DE CONSTRIÇÃO SOBRE O MESMO BEM. INSTITUIÇÃO DO CONCURSO DE PREFERÊNCIAS EX OFFICIO. SÚMULA 07 DO STJ.
1. A preferência dos créditos trabalhistas sobre os créditos tributários, prevista no art. 186, do CTN, não se limita ao concurso universal de credores, em razão de insolvência civil ou falência, aplicando-se, da mesma forma, aos casos de execução contra devedor solvente.
2. É que o art. 711, do CPC sobrepõe a preferência de direito material à de direito processual consagrada na máxima prior tempore potior in iure.
3. Deveras, o art. 186, do CTN, antes da alteração trazida pela LC n.º 118/2005, dispunha que: "O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for a natureza ou o tempo da constituição deste, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho."
Consectariamente, o próprio CTN privilegiou o crédito trabalhista, in casu, objeto de execução aparelhada.
4. Raciocínio inverso conspiraria contra a ratio essendi do art. 186, do CTN, o qual visa resguardar a satisfação do crédito trabalhista, tendo em vista a natureza alimentar de referidas verbas, sendo irrelevante para a incidência do preceito, a natureza jurídica da relação que originou a execução fiscal, sobre se contra devedor solvente ou insolvente.
5. É pacífica a necessidade de pluralidade de penhoras sobre o mesmo bem para que seja instaurado o concurso de preferências, estendendo-se essa regra aos casos de arresto, para fins do art. 711 do CPC, considerando que essa providência constritiva traduz medida protetiva de resguardo de bens suficientes para a garantia da execução, passível de posterior conversão em penhora, sendo, inclusive a ela equiparado pelo artigo 11 da LEF. (Precedentes:Resp 636.290/SP, DJ 08.11.2004; REsp 655233/PR, DJ 17.09.2007)
6. Atendendo a esse requisito, dessume-se a possibilidade de instituição do concurso de preferências, consoante extrai-se do aresto dos embargos de declaração, in verbis: "(...) Inúmeras penhoras são apontadas, inclusive no rosto dos autos, quer pela decisão atacada, fls. 12/13 e 292/293, quer pela própria embargante, fl. 285."
7. Com efeito, vários precedentes deste Tribunal Superior assentam a obrigatoriedade de que o credor privilegiado, com vistas a exercer a preferência legalmente prevista, demonstre que promoveu a execução e que penhorou o mesmo bem objeto de outra constrição judicial, nos termos do art. 711 do CPC. (Precedentes: REsp 33902/SP, DJ 18.04.1994; REsp 655233/PR, DJ 17.09.2007; CC 41.133/SP, DJ 21.06.2004; REsp 88683/SP, DJ 24.03.1997)
8. Entrementes, a verificação de tais providências pelos detentores de créditos trabalhistas, à míngua de informação precisa nas decisões exaradas nos autos, implica o revolvimento do contexto fático-probatório, o que é insindicável na estreita via do recurso especial, consoante o enunciado da Súmula 07 do STJ.
9. Recurso especial parcialmente conhecido e nessa parte desprovido."
(REsp 871190/SP, Relator(a) Ministro LUIZ FUX- Primeira Turma, DJe 03/11/2008)

"TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. CONCURSO DE CREDORES. PREFERÊNCIA. CRÉDITOS TRIBUTÁRIO E CIVIL.
1. Conforme jurisprudência do STJ, no concurso de credores, a preferência se estabelece na seguinte ordem: os créditos trabalhistas, os da Fazenda Federal, Estadual e Municipal e os com garantia real. Essa ordem de preferência certamente não fica comprometida pela sub-rogação a que se refere o art. 130 do CTN.
(.....)
2. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido."
(REsp 776482 / RS, Relator(a) Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Primeira Turma, DJe 06/05/2009)

"RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA SOBRE O MESMO BEM OBJETO DE OUTRA EXECUÇÃO. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DIREITO DE PREFERÊNCIA. RECURSO PROVIDO.
1. Havendo pluralidade de penhora sobre o mesmo bem, devem ser analisadas duas situações: em primeiro lugar, a existência de crédito privilegiado, em decorrência de previsão legal; afastada essa hipótese, em segundo lugar, a anterioridade da penhora. Na hipótese da existência de privilégio em virtude da natureza do crédito, deve o credor privilegiado, a fim de exercer a preferência legalmente prevista, demonstrar que promoveu a execução, e que penhorou o mesmo bem objeto de outra constrição judicial, conforme prevê o art. 711 do Código de Processo Civil.
2. Reconhecido pela Corte de origem que a execução fiscal movida pelo Estado do Paraná está garantida pelo mesmo bem objeto de penhora na execução promovida pelo particular, há de prevalecer o direito de preferência daquele sobre o produto da arrematação, porquanto o crédito fiscal goza de privilégio sobre os demais créditos, à exceção daqueles de natureza trabalhistas e dos encargos da massa, na hipótese de insolvência do devedor.
3. Recurso especial provido."
(REsp 655233/PR, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, Primeira Turma, DJe 17.09.2007 p. 210)

Com relação ao crédito do FGTS, por constituir direito social do trabalhador, detém os mesmos privilégios atribuídos aos créditos trabalhistas. É o que dispõe o art. 2º, § 3º, da Lei 8.844/94, a saber:

Art. 2º ...
(...)
§ 3º Os créditos relativos ao FGTS gozam dos mesmos privilégios atribuídos aos créditos trabalhistas. (Incluído pela Lei nº 9.467, de 1997)

O Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar controvérsia sobre as prerrogativas dos créditos de FGTS, assim se manifestou:

"PROCESSUAL CIVIL. FGTS. EXECUÇÃO FISCAL. CONCURSO DE CREDORES. PREFERÊNCIA DO FGTS EM FACE DOS CRÉDITOS DE NATUREZA TRIBUTÁRIA.
1. Os créditos do FGTS desfrutam das mesmas prerrogativas gozadas pelos créditos trabalhistas (art. 2º, § 3º, da lei 8.844/94).
2. Recurso especial desprovido."
(REsp 720.084/PR, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21.08.2007, DJ 17.09.2007 p. 213)

Diante da legislação que rege a matéria e da jurisprudência, não restam dúvidas de que créditos decorrentes contribuição ao FGTS, por se equipararem aos trabalhistas, são preferenciais aos tributários, incidindo, então, o critério da ordem de pagamento previsto nos arts. 612 e 613, ambos do CPC.

Dessarte, deve ser mantida a parte da decisão agravada que, considerando a data da penhora, colocou os créditos do FGTS na frente do crédito do agravante.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo de instrumento, para reconhecer, no concurso de preferências, que o crédito trabalhista do agravado de ser pago antes dos créditos tributários.

 
Des. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE
Relatora